sexta-feira, 9 de março de 2012

Autobiografia do Silêncio

     

     Enconstado no silêncio, não morreremos da verdade. Sem as revelias expurgatórias de uma realidade barulhenta a inundar os sentidos, com suas ebriedades e desfaçatez características, o puro estado silencioso avilta novas paisagens através dos encontros, sempre novos, entre o corpo e as quietudes do espelho sem vidro do tempo. O espírito desdobra-se a encontrar um novo contorno, um novo plano palpável, uma nova escultura a ser desenhada nos meandros da pureza. A clandestinização do silêncio, a pleitear novas biografias contornadas pelas velas acesas, convulsiona, desregra o sentido. O estado de torpor é inevitável: toma-se conta da purificação tempestuosa que se debate. Relegado a um plano secundário, marginalizado para à flor da pele, o silêncio abafado dos afetos acaba por derramar-se na corrente sanguínea. Derramado, subtrai-se ao eu. O silêncio é a Alice atrás do espelho. Não vê, sente. O desvio das palavras, esvai-se a lógica, desregra-se sentidos, multiplicam-se os afetos, afetam-se outros corpos. A intervenção cartográfica, a hibridização do corpo ao tempo, o afeto incontrolável.
      Não, silêncio não é resistência. Insuportável pensar numa mera resistência às palavras, os afetos depontados no plano do silêncio escapam. As palavras tomam o silêncio, e eis uma nova política quando as palavras tem por objeto este silêncio! Insuflado de espera e desejo, não se silencia mais. A quietude que espera e deseja apenas se cala. Flutuação nômade pelo afeto, o silêncio reifica-o. Integração imanente, o afeto torna possível o silêncio. Se há algo a se compreender, que seja este silêncio:

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