segunda-feira, 9 de abril de 2012

Saudosismo.


Vinho na mão direita, cigarro na esquerda. Pernas cruzadas.



- Não consigo mais.

- O que quer dizer?

- Também não sei. Por isso falei.

- Também não consigo. Estamos no mesmo barco, então.

- Não, é diferente agora.

- Somos diferentes agora?

- Não, nossa posição é diferente.



Pausa. Tragada forte, bebericou o vinho seco. Molhou os lábios.



- Não acho que isso dure.

- Por mais que tento, não consigo. É como se.

- Nos houvéssemos perdido.

- Escondidos entre a poeira, num dos cantos do apartamento.

- Tenho a mesma sensação.



O gole foi maior dessa vez.



- É o fim?

- Não tenho ideia. Você acha?

- Também não sei. Por isso falei.

- Mas ainda há. Ainda há alguma coisa.

- Como assim?

- Nada. Deve ser só lamúria.

- Então somos dois saudosos olhando pra trás.



Ela riu, e fumou. Ele bebeu o resto da taça de vinho. Jogou seu olhar nos olhos dela. Mirou-se, e riu.



- Não tenho vergonha disso.

- Porque teria?

- Porque nos escondemos, talvez. Emudecemos. Ou pior: as vozes se acostumaram. E nossas bocas viraram o endereço da repetição. Porque quem está à nossa frente nos repudiou, e tivemos que esquecer. Nossa geração de sobreviventes.

- Ultrapassada geração.

- Não ainda não. Mas, sim, sobreviventes.

- Lamentamos por nossa geração.

- Não, também não. Somos dois saudosos olhando pra trás lembra?



Ele riu de lado. As taças vazias, o cigarro no fim.



- Um brinde. A nós, sobreviventes.

- Uma porção de nós, por favor.

- Para sempre.

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