Vinho na mão direita, cigarro na esquerda. Pernas cruzadas.
- Não consigo mais.
- O que quer dizer?
- Também não sei. Por isso falei.
- Também não consigo. Estamos no mesmo barco, então.
- Não, é diferente agora.
- Somos diferentes agora?
- Não, nossa posição é diferente.
Pausa. Tragada forte, bebericou o vinho seco. Molhou os lábios.
- Não acho que isso dure.
- Por mais que tento, não consigo. É como se.
- Nos houvéssemos perdido.
- Escondidos entre a poeira, num dos cantos do apartamento.
- Tenho a mesma sensação.
O gole foi maior dessa vez.
- É o fim?
- Não tenho ideia. Você acha?
- Também não sei. Por isso falei.
- Mas ainda há. Ainda há alguma coisa.
- Como assim?
- Nada. Deve ser só lamúria.
- Então somos dois saudosos olhando pra trás.
Ela riu, e fumou. Ele bebeu o resto da taça de vinho. Jogou seu olhar nos olhos dela. Mirou-se, e riu.
- Não tenho vergonha disso.
- Porque teria?
- Porque nos escondemos, talvez. Emudecemos. Ou pior: as vozes se acostumaram. E nossas bocas viraram o endereço da repetição. Porque quem está à nossa frente nos repudiou, e tivemos que esquecer. Nossa geração de sobreviventes.
- Ultrapassada geração.
- Não ainda não. Mas, sim, sobreviventes.
- Lamentamos por nossa geração.
- Não, também não. Somos dois saudosos olhando pra trás lembra?
Ele riu de lado. As taças vazias, o cigarro no fim.
- Um brinde. A nós, sobreviventes.
- Uma porção de nós, por favor.
- Para sempre.
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